quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

SIMBOLISMO DO NATAL E DO NASCIMENTO DO MESTRE JESUS, O CRISTO

 


O final do ano e o começo do ano novo são momentos em que nos inquietamos e nos tornamos mais tolerantes. É claro que seria bem melhor se perdoássemos uns aos outros todos os dias do ano, mas parece que isto só é possível no Natal e no Ano Novo! De repente, nós nos lembramos que temos vizinhos, uma família e pessoas a quem queremos bem, e lhes oferecemos nossos melhores votos.
Apesar de todas as nossas boas intenções, na realidade, continuamos indiferentes! Pensar e se comportar consciente e amorosamente um dia por ano e passar por cima disto durante todo o resto do ano, isto mexe com a consciência!

 
Lembrar que nosso divino Mestre Jesus, o Cristo, jamais sugeriu que comemorássemos a data de seu nascimento, em nenhuma das escrituras, canônicas, apócrifas ou gnósticas.Veja o que ele nos pediu:

E, tomando o pão, e havendo dado graças, partiu-o, e deu-lho, dizendo:


 
"Isto é o meu corpo, que por vós é dado; fazei isto em memória de mim." Lucas 22:19. "E Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; e era este sacerdote do Deus Altíssimo." Genesis 14:18


 
O Sol realiza a cada ano uma viagem elíptica que começa no dia 25 de dezembro, e então regressa ao pólo sul; exatamente por isto vale a pena refletirmos em seu significado profundo. Nesta época começa o frio no hemisfério norte, devido exatamente ao fato de que o Sol vai se afastando para as regiões austrais e, no dia 24 de dezembro, terá atingido o ponto máximo de sua viagem na direção sul. Se o Sol não avançasse rumo ao norte do dia 25 de dezembro em diante, morreríamos de frio. A Terra inteira se converteria em um bloco de gelo e realmente pereceriam todas as criaturas, tudo o que tem vida.
Assim, vale a pena refletir sobre o acontecimento do Natal. Na época do Natal os dias são curtos e as noites longas. Vamos refletindo sobre tudo isto, e convém que entendamos o que é o Drama. É necessário que também em nós nasça o Cristo-Sol, ele deve nascer em nós.
 
A palavra Cristo, a qual foi acrescentada como um "segundo nome" não é um nome pessoal e "sim uma descrição de um estado de consciência". Desse modo, existe dois nascimentos: o de Jesus (o homem) e o do Cristo em Jesus.
 
Séculos antes os egípcios já realizavam, nessa época, grandiosos cerimoniais nos quais homenageavam o Sol símbolo da Luz Espiritual. Cerimônias semelhantes eram feitas pelos incas, astecas, caldeus, comunidades gregas, nos cultos de Mitra. E, curiosamente, esses povos, com diferentes religiões, tinham suas celebrações no mesmo período do ano.
 
Em todas as religiões, no seu aspecto externo, ocorreu uma antropomorfização do Sol. O Sol Oculto e invisível, do qual o visível é uma reflexão, sempre foi o emblema da divindade. Mitra, a antiga divindade persa, era um Deus-Sol, o dispensador da luz. Também nos Vedas encontra-se Mitra, uma das doze personificações do Sol. Ainda na tradição oriental Sûria é o Sol. Na Grécia e em Roma existiam festas em homenagem ao Sol.
 
Fica claro que a celebração feita ao final de dezembro não é uma posse exclusiva do Cristianismo, mas uma comemoração mística existente em todas as grandes religiões.
 
Na antiga Religião Egípcia o Sol era o símbolo do divino por excelência, sua luz era considerada uma manifestação visível de Deus. Osíris era chamado "Alma do Sol" e o sol nascente era personificado em Hórus.
 
Em 345 d.C. uma encíclica emitida pelo Papa Júlio decretou o deslocamento da data do natal de 25 de março para 25 de dezembro.
   
Com a expressa afirmação de que esta medida foi tomada para alinhar a celebração cristã do nascimento do Salvador com o costume dos seguidores de Baco e de Mitra que comemoravam o nascimento da Divindade no solstício de inverno". Portanto, é um reconhecimento oficial em relação ao fato de que a celebração do natal é anterior ao nascimento de Jesus.

Após o solstício, a Terra em seu movimento em torno do Sol, atinge a sua menor distância em relação ao Sol. Em termos místicos significa que com o nascimento do Cristo a luz aproxima-se mais dos homens.

Quase todo o ocidente, europeu e americano, se diz cristão: muitos lêem os Evangelhos, fazem sermões, conferências e escrevem poesias sobre os ensinamentos de Jesus, mas quantos orientam a sua vida pelas grandes verdades do Cristo?

"Tornai-vos praticantes da palavra, e não simples ouvintes, enganando-vos a vós mesmos!" Mestre Jesus , o Cristo (Ti 1:22).




A cena do Natal,

rememorada com profunda alegria por milhões de cristãos todos os anos, está repleta de símbolos. O estábulo, ou gruta, representa o corpo físico que abriga em seu interior todos os membros da família divina, que são os diferentes princípios do homem. A manjedoura, onde o Cristo menino está reclinado, utensílio usado na alimentação dos animais, representa o corpo vital ou etérico que preserva e distribui o prana, ou força vital do sol, pelo corpo físico. Os carneiros e as vacas representam as emoções. Para que o Cristo possa nascer pressupõe-se que esses animais tenham sido domesticados, ou seja, que as emoções do candidato à iniciação tenham sido disciplinadas e purificadas.Os pastores representam os irmãos mais velhos e guias da humanidade, os Mestres que sempre comparecem às cerimônias de iniciação.





O batismo,

de Jesus por João Batista representa a segunda grande iniciação. A imersão nas águas do Jordão tem um profundo significado místico. A água sempre foi usada como símbolo das emoções e paixões. Para que um iniciado possa capacitar-se a agir como um instrutor e salvador de almas, torna-se necessário que passe por a transfiguração.
 
 
A transfiguração retrata o processo de iluminação, que na terceira iniciação é parcial, enquanto na quinta é total e definitiva. O relato menciona que a cena ocorre num monte (Mt 17:1-8), o que significa uma elevação do estado de consciência. Assim como na primeira iniciação os pastores de alma estavam presentes, também nessa ocasião os predecessores de Jesus no caminho da perfeição (Moisés e Elias) participam desse momento de glória.essas experiências, que compartilhe a dor do mundo. Assim, o mergulho nas águas simboliza essa profunda experiência de sintonia com a dor de todos os que sofrem e anseiam por uma vida de felicidade, saúde e harmonia. Ao aceitar voluntariamente compartilhar a dor do próximo, o iniciado assinala ocultamente que está pronto para receber a Graça divina.

O Poder divino é conferido quando, simbolicamente, Jesus emergiu da água e "os céus se abriram e ele viu o Espírito de Deus descendo como uma pomba e vindo sobre ele" (Mt 3:16). O iniciado que se compromete a servir a Deus na labuta de salvação da humanidade demonstra ser um filho dileto do Pai, o que é confirmado por uma voz celestial que afirma: "Este é o meu filho amado, em quem me comprazo" (Mt 3:17).




A comunhão do pão e do vinho dos doze apóstolos.

Toda a cena e seus personagens, no seu sentido esotérico, deve ser entendida como simbólica. Mestre Jesus e seus doze apóstolos simbolizam a totalidade do ser humano, sendo a casa onde ocorre a ceia a representação do corpo físico, o templo de deus 22:11), ou seja, num estado de consciência elevado. Jesus representa a natureza divina do homem, o Cristo interior.

Os doze apóstolos personificam as características do homem no mundo, com suas qualidades e fraquezas Pedro, por exemplo, representa a impulsividade e pusilanimidade do homem que ainda não aprendeu a controlar suas emoções. João, o discípulo que Jesus amava, retrata a alma, a unidade de consciência, que busca a inspiração do Alto, simbolicamente reclinando sua cabeça (símbolo da mente) sobre o coração de Jesus (símbolo do Cristo interior), para aí permanecer no aguardo da Graça Divina.

A sagrada eucaristia representa a integração do ser humano. Os aspectos da natureza humana, com suas negatividades e qualidades, os doze discípulos, recebem do Mestre Jesus, o pão e o vinho, símbolos da carne e sangue do Cristo, com a admoestação: "Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós" (Jo 6:53).

Após a exaltação conferida pela terceira iniciação, a inexorável lei divina da harmonia leva o iniciado a experimentar o seu oposto. No relato bíblico isso é apresentado como a experiência no Getsêmani, que ocorre apropriadamente após a ceia pascal (Mt 26:36-45). Mestre Jesus convida três de seus discípulos mais próximos a acompanhá-lo, para juntos orarem.

Mas naquele momento de angústia, em que o iniciado descortina sua missão e os sacrifícios e sofrimentos que lhe sobrevirão, ele verifica que está só. Não conseguirá nenhum apoio externo ou interno nesse momento de solidão, o que é simbolizado nos evangelhos pelos discípulos dormindo durante a oração (Mt 26:40-45).

Numa atitude normal a qualquer ser humano, ao perceber o intenso sofrimento que lhe aguardava, Mestre Jesus invoca a Deus e diz: "Pai, se queres, afasta de mim este cálice" (Lc 22:42). Porém, como iniciado comprometido com a missão de redenção da humanidade, aceita as conseqüências de uma vida altruísta de total desapego, ainda que ao preço de sua própria vida, e submete-se humildemente à vontade divina.

O portal da quarta iniciação abre-se para o servidor resoluto e dedicado que aceita beber o cálice amargo da vida de serviço. Os sofrimentos intensos pelos quais passa o iniciado que aceita carregar a cruz do mundo e assumir parte do pesado carma da humanidade são representados nos evangelhos pelos dolorosos relatos da paixão do Senhor.

A morte para o mundo e a ressurreição para a vida eterna, os dois aspectos complementares que simbolizam a quarta iniciação, têm lugar em Jerusalém, a cidade santa. O iniciado deve entrar nesse elevado estado de consciência em plena posse de suas faculdades humanas, ou seja, num corpo físico. Isso é simbolizado pela entrada de Jesus em Jerusalém montado num jumento, um quadrúpede domesticado, que representa os  corpos inferiores do homem devidamente disciplinados.

O estágio do sofrimento parece ser o companheiro inseparável do iniciado. Na história de Jesus, começa com o sofrimento psíquico antecipado no Getsêmani, onde ele se sente terrivelmente solitário e sem o apoio de seus discípulos. No desenrolar dos acontecimentos, segue-se a traição de um discípulo e a fuga dos outros quando se sentem ameaçados.

Cristo é escarnecido e insultado pela multidão enfurecida, representando as paixões dos homens que sempre zombam da natureza divina. Depois ele é açoitado e espancado pelos soldados, que são os condicionamentos da natureza inferior que seguem as ordens de nosso inconsciente, sempre preocupado com a manutenção do status quo de nossa vida mundana.

O julgamento é feito por Pilatos, o governante da ordem exterior, que simboliza a personalidade. Mestre Jesus é devidamente apresentado como aquele que procura subverter a nação e, quando interrogado por Pilatos, confirma que é o Cristo, rei da natureza humana.

A personalidade, ao lavar as mãos, procura, como sempre, justificar-se alegando não ter culpa por condenar um inocente, pois está atendendo ao clamor da plebe (as paixões) e à recomendação dos sacerdotes, os líderes da natureza inferior, que representam o egoísmo, a ignorância, o orgulho e a ambição.

Seguindo a tradição, Pilatos pergunta ao povo se prefere a libertação de Jesus ou do criminoso Barrabás.

As paixões pedem a crucificação da natureza divina e a libertação do criminoso com o qual, em sua ignorância, identificam-se.

O relato da paixão de Jesus representa a via crucis de todos os que passam pela quarta iniciação: devem morrer para o mundo para alcançar a consciência permanente do Reino de Deus, a consciência da vida eterna.

É interessante notar que a crucificação tem lugar no monte Gólgota, ou calvário, que significa a caveira. A culminação dessa importante iniciação ocorre mais uma vez num monte, uma clara indicação de um estado elevado de consciência.

O Golgota representa o crânio humano, o lugar físico onde a consciência divina é crucificada. Jesus, expressando a consciência divina, é crucificado entre dois malfeitores, um dos quais seria o bom ladrão (Lc 23:39-43).

Os dois ladrões simbolizam os dois aspectos da mente, um dos quais se volta para o alto e segue o Salvador rumo ao Reino dos Céus. O túmulo na rocha no qual Jesus teria sido enterrado é também outra representação de que o Cristo espiritual é enterrado no plano mais denso da manifestação, o plano físico, de onde só é libertado após cumprir sua missão terrena.

É dito no Credo dos Apóstolos que, após a morte, Jesus "desceu ao inferno e ao terceiro dia ressuscitou dos mortos." Na Bíblia é dito que: "Morto na carne, foi vivificado no espírito, no qual foi também pregar aos espíritos em prisão" (1 Pd 3:19).

Para os antigos o inferno não tinha a conotação de tormento eterno estabelecida mais tarde pela igreja. O inferno era tido como uma região ou lugar oculto, o Hades dos gregos, enfim, um submundo habitado pelas pessoas que deixavam o corpo físico para trás.

A interpretação esotérica é que todo iniciado deve descer ao mundo e levar a luz e a esperança para as almas atormentadas pelo remorso dos erros cometidos quando encarnadas no mundo.

A morte e a ressurreição do Cristo representam alegoricamente a quarta iniciação. O que morre não é o corpo físico, mas o sentido pessoal de separatividade.

O que ressurge dos mortos é a alma agora consciente da unidade com o Todo e com todos os seres. A partir desse momento a alma pode deixar o sepulcro terreno, que é o corpo físico, sem nenhum lapso de consciência e entrar nas regiões superiores do mundo celestial.

A vivência da unidade confere ao iniciado uma profunda compaixão. Ele agora, além de procurar aliviar a dor dos que sofrem injustiças e violências, busca ajudar os injustos e criminosos. Ele sabe que o injustiçado, caso tenha a atitude correta, estará terminando seu ciclo cármico, enquanto o criminoso está iniciando o seu, atraindo para si pesada carga de sofrimento, na justa medida do sofrimento que causou. O iniciado só estará pronto para a quarta iniciação quando puder perdoar aqueles que lhe ferem, bem como os que ferem a todos os fracos e oprimidos, como Mestre Jesus, que em meio à agonia da crucificação, disse: "Pai, perdoa-lhes: não sabem o que fazem" (Lc 23:34).


Para os budistas e hinduístas, aquele que recebeu a quarta iniciação é chamado de Arhat, sendo conhecido como o liberto que não mais precisa retornar ao mundo dos homens, tendo merecido o descanso paradisíaco no que chamam de Nirvana.

A maioria, no entanto, movidos pela suprema compaixão, comprometem-se a permanecer na esfera terrena para ajudar na libertação de todas as almas sofredoras, até o fim dos tempos.

A alma (Jesus) agora venceu a morte, porque morreu para o mundo. Simbolizando o término de seu ministério terreno, o iniciado diz, como Mestre Jesus na cruz: "Está terminado" (Jo 19:30) e "Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito" (Lc 23:46).

No relato bíblico Mestre Jesus retorna dos mortos e fica algum tempo instruindo seus discípulos, preparando-os para prosseguirem com o ministério de salvação das almas. Esse retorno ao mundo terreno, seja num corpo físico, seja num corpo sutil, dependendo dos textos consultados, comprova o compromisso do iniciado em permanecer em nossa esfera terrena instruindo e ajudando a humanidade. Chega finalmente o dia que, em grande glória, ele ascende ao céu.




No Pistis Sophia

A ascensão é descrita de forma tocante, com a descida de anjos portando seus mantos de luz. Uma vez envolvido na luz, Mestre Jesus é transfigurado e seus discípulos não podem agüentar o brilho de sua luz até que Mestre Jesus desaparece no alto. Jesus, como todo o adepto que recebeu a quinta iniciação, pode agora dizer: "Eu e o Pai somos um" (Jo 10:30).


A quinta iniciação indica o término do aprendizado humano. O Mestre de Compaixão e Sabedoria alcança a perfeição e passa a ser um salvador de almas, seres, muitas vezes descritos como divinos. São verdadeiros mensageiros de Deus, trazendo, como Mestre Jesus, a eterna mensagem de salvação para as almas sofredoras.



E essa é a meta que o Pai celestial estabeleceu para todos nós.

Qual seria a possível contraparte penosa para quem alcançou a união com Deus? Para quem permanece constantemente na bem aventurança de perfeita unidade com Deus, o seu estado oposto é justamente deixar esse estado paradisíaco. Essa é justamente a provação do Mestre de Compaixão e Sabedoria!

O Ego material-mental-emocional, que assume milhares de formas e feitios. O Eu crístico e o Ego anti-crístico, agem em duas dimensões diametralmente opostas. O Anti-Cristo só conhece "os reinos do mundo e sua gloria" e promete dá-los em recompensas aos seus adoradores e servidores, porque são dele, creação do príncipe deste mundo, que é o poder das trevas na linguagem do Cristo.

O Cristo porém, afirma que "o meu Reino não é deste mundo", não é do caráter deste mundo que , "jaz no maligno", que é "dominado pelo príncipe deste mundo".
"Devemos viver no mundo sem ser do mundo.Vivemos na terra de um inimigo, que o Mestre Jesus, o Cristo chama "o príncipe deste mundo". (João 16:11) .

A tendência é fazer Cristo à imagem e semelhança dos "cristãos", já que estes não tem a coragem de subir às alturas daquele. Fazer descer Cristo ao nosso nível condiz muito mais com o comodismo e o menor esforço dos que não querem sublimar-se ao nível dele.

Em livros, filmes, e teatros, do alto das cátedras universitárias e dos púlpitos das igrejas se proclamam um pseudo-Cristo profano, horripilante, caricatura do Cristo do Evangelho e da realidade. E o que é há de mais repugnante é que são precisamente sacerdotes, pastores de igrejas cristãs, (*e muitos "místicos" de ocasião) que, de preferência, promovem essa deturpação do Cristo.

O homem intelectual, escreve Einstein, descobre aquilo que é, mas o homem espiritual realiza em si aquilo que deve ser, aquele é um descobridor de fatos, este é um creador de valores. Valor é Realidade eterna, fatos são reflexos passageiros.

No Evangelho de Tomé, os alunos dizem a Jesus:

"Diz-nos: como será o fim?" E Mestre Jesus diz:

"Já descobristes o começo? Pois onde está o começo, aí está o fim. Bem-aventurado aquele que se mantém no começo; ele conhecerá o fim e não experimentará a morte."


Seus discípulos lhe disseram: "Mostra-nos o lugar em que estás, pois é necessário que o procuremos." E ele disse:



"Que aquele que tem ouvidos ouça. Há luz no Homem de luz e ele ilumina o mundo inteiro, Se ele não tiver luz, está nas trevas."

 
Aceitar Cristo é fácil, viver o Cristo isto é um problema de imensa gravidade.



Sem esse encontro consigo mesmo, nenhum homem realizará o seu encontro com Deus.



"Ainda que Cristo nascesse


mil vezes em Belém

e não em vossa alma,

ainda assim estaríeis perdido.

Na verdade, a Palavra eterna

continua nascendo hoje.

Onde? Em uma alma

que se perdeu em si mesma.

A porta da bem-aventurança

só pode ser atravessada

por aquele que renasceu

para uma vida totalmente nova.

Ó homem, tu indagas:

onde está o trono de Deus?

Ele está lá onde Deus renasce em ti

como Filho!

Se renasces de Deus,

em um certo sentido fazes

que ele renasça em ti.

Então, tu sais e Ele entra."

Angelus Silesius

 
BOAS FESTAS , FELIZ NATAL DO SEU CORAÇÃO, QUE O TEU CRISTO INTERNO, TEU SOL INTERIOR POSSA SE TORNAR CADA DIA MAIS BRILHANTE, PRESENTE, ATIVO E DESPERTO EM VOCÊ.*A propósito, Mestre Jesus, não nasceu dia 25/12.






quinta-feira, 5 de abril de 2012

Sufi - O encontro do homem com o Espírito


O encontro do homem com o Espírito. Quando o homem sintoniza sua vida com o divino novamente desperto dentro dele, após um período de preparação se desenvolve uma nova consciência, ligada ao Espírito divino.
Essa bem-aventurada experiência é a da personagem chamada Chidr nos ensinamentos islâmicos/sufis.
Na narrativa de Sohravardi, quando a alma buscadora indaga ao sábio como se desfazer da “cota de malha da matéria”, como se desembaraçar dos laços da natureza terrestre, ele lhe responde: “Torna-te semelhante a Chidr”.
“Torna-te semelhante a Chidr”.
A alma percebe que a libertação dessa armadura de ferro é algo doloroso.
Consternada, ela faz a seguinte pergunta:
Mestre, o que é preciso fazer para aliviar essa miséria?
E o mestre responde: Vai à fonte da Vida, verte essa água sobre tua cabeça até que a cota de malha possa facilmente cair, protegendo-te ainda dos golpes de espada, pois essa água afina as malhas de modo que os golpes se tornam menos duros de suportar.
Mestre, onde se encontra a fonte da Vida?
Nos lugares escuros. Se tu queres ali chegar, calça os sapatos corretos e toma o caminho da esperança, até que chegues aos lugares escuros.
De que lado começa o caminho?
Não importa onde. Se o segues verdadeiramente, alcançarás teu objetivo.
O que é que caracteriza esses lugares escuros?
Tu te encontras neles sem o saberes. Quem quer que encete o caminho vê-se na escuridão, na qual já se encontrava, e percebe que jamais viu a luz. Esse é o primeiro passo do peregrino. A partir daí é possível avançar. Uma vez alcançado esse ponto, ele pode prosseguir.
Nosso destino é começar por aí?
Quem deseja encontrar a fonte da Vida vagueia desesperadamente na escuridão. Mas, no momento em que se torna digno, vê a luz. Quem descobre a fonte da Vida e nela se lava torna-se semelhante a Chidr.
Sohravardi menciona muito concisamente esse personagem misterioso associado à fonte da Vida tanto na tradição popular ortodoxa do Islã como no sufismo.
A ele é atribuída toda uma gama de qualificações que vão desde curador miraculoso até Ser espiritual supremo, e os muçulmanos o veneram em numerosos santuários onde ele é reputado como portador de felicidade.
Numerosos textos sufis descrevem o encontro com Chidr. Essa é uma experiência marcante que transforma completamente a vida e que freqüentemente gera um grande desgosto pelas coisas deste mundo.
Contudo, no que diz respeito a certos sufis, essa experiência essencial não parece modificar muito sua vida exterior. Há os que fazem de Chidr seu irmão, outros o consideram seu pai espiritual, e há os que o vêem na forma de um homem que os guia no caminho. Seria possível igualmente considerá-lo um ser espiritual microcósmico que acende a chama da nova consciência. No plano cósmico, ele é o guia espiritual da humanidade.
Nesse papel de guia interior, a tradição islâmica o apresenta como o servidor anônimo de Deus que guia Moisés. Segundo o Corão, Moisés deve passar por três tentações, e esse servidor que possui a sabedoria divina o adverte: “Tu não poderás ficar comigo até o fim. Como poderias suportar certas coisas se não as compreendes?” (Surata 18:65-82)
Ele leva Moisés consigo com a condição de que ele não faça nenhuma pergunta a respeito de suas ações. Como é evidente, ocorrem três coisas que levam Moisés a achar a maneira de agir de seu guia tão falsa e repreensível que ele não consegue manter sua palavra e acaba interrogando-o. Moisés, o homem da lei, não consegue explicar esses incidentes, falta-lhe ainda a percepção interior, pois ele os interpreta segundo a lógica, a moral e os critérios comuns.
Em seguimento a essa passagem do Corão, o sufismo faz uma distinção entre o “conhecimento chídrico” e o “conhecimento mosaico”.
Moisés representaria, neste caso, o “imame dos homens exteriores” e Chidr seria o possuidor do verdadeiro conhecimento, a gnosis (Ma´rifa em árabe).
Chidr é “o senhor dos mistérios”: “Sabe que Chidr é o reflexo do nome secreto de Deus e que seu lugar é o do Espírito”, declara o sufi persa Abd ar-Razzaq.
Para o sufismo, o conhecimento especial encarnado por Chidr, o conhecimento divino, é o saber “proveniente de Deus” ou “na presença de Deus”, descrito na 18ª surata.
O grande mestre Ibn al-Arabi afirma numa carta:
“Sabe, ó irmão, que, para nós, o conhecimento somente é perfeito quando vem diretamente de Deus, sem passar pela mediação da tradição ou de um xeique. Quem se ocupa apenas do que diz a ortodoxia em todos os seus detalhes deixará escapar a felicidade de seu Senhor. A pessoa que passa sua vida a perscrutar as tradições de maneira científica não encontrará a verdade. E se, ó irmão, tu segues o caminho acompanhado dos guias divinos, chegarás à contemplação de Deus e de Deus receberás o conhecimento de todas as coisas mediante justa inspiração, como o ensina Chidr, e isso sem nenhum esforço, nem dor, nem insônia.”
Chidr e Alexandre, o Grande. Nem sempre Chidr representa o guia espiritual, mas com freqüência ele também representa o próprio buscador.
No decorrer dos tempos, os autores muçulmanos ligaram-no às várias tradições antigas com o fito de mostrar a evolução que o faz tornar-se o “servidor imortal de Deus”.
Um mito bastante divulgado nas culturas grega e siríaca, conta que Alexandre, o Grande, buscava a fonte da Vida.
No século X, por exemplo, o teólogo Ibn Baboye relata o seguinte:
“Escreveu-se que ele era a fonte da Vida, e que os que bebessem dessa fonte não morreriam até que ouvissem o chamado para despertar, no dia da ressurreição. Quando, então, Alexandre partiu para sua busca, chegou a um local onde havia trezentas e sessenta fontes. Chidr era responsável pelo comando e Alexandre era, entre todos, o mais amado. Ele deu a Chidr e também a cada um de seus companheiros um peixe salgado, dizendo: ‘Mergulhai vosso peixe numa fonte, não importa em qual delas’. Chidr dirigiu-se para uma das fontes e mergulhou seu peixe, e eis que este reviveu e fugiu”.
Ao ver isso, Chidr soube que havia encontrado a fonte da água da Vida. Para os últimos autores sufis, a fonte da Vida é, sobretudo, a fonte da compreensão, e “esta se encontra oculta em vossa casa”, dizem eles.
Ali al Qari, indiretamente, liga o conhecimento à luz: “É dito: a água da Vida evoca o conhecimento, e a escuridão, a ignorância”.
Para ele, assim como para Sohravardi, a fonte da Vida guardada por “Chidr, o tempo” encontra-se nas trevas, e quem nela se banha ou dela bebe se eleva na luz eterna. Chidr, o Verde.
A íntima relação entre Chidr e a fonte da Vida explica igualmente o seu nome, que significa “verde”, em árabe.
Dizem que toda vez que Chidr toca a terra, os campos e as flores, tudo desabrocha.
Esta é uma idéia bastante profunda, pois a cor verde representa um papel importante no islamismo e no sufismo.
Em certos textos, os diferentes estágios do desenvolvimento da consciência e da alquimia são comparados às cores.
Aqui, os ensinamentos do sufismo ligados à alquimia comparam-se aos ensinamentos do persa Nadjm ad-Din al Kubra, do século XII. Nadjm afirma claramente, no início de sua obra: “Nosso método é alquímico. Odores deliciosos da amizade e da manifestação da sublimidade”.
Para ele, a cor verde é a cor da “força vital do coração”. Essa cor é a última que subsiste; dela emanam as irradiações cintilantes banhadas de um clarão radiante. Embora às vezes turva, essa cor pode ser perfeitamente límpida. Sua turvação indica um retorno à escuridão da natureza, enquanto sua pureza traduz a soberania da Luz divina.
No século XI, o persa Simnani levantou a hipótese de que o homem possui sete órgãos sutis (os sete centros energéticos ou chacras), e a cada um deles ele deu o nome de um profeta. Assim ele explica o Corão de forma penetrante: não se trata de personagens históricos, mas sim de símbolos que mostram o crescimento da alma.
O sétimo órgão sutil (latifa) é “Maomé em teu ser”. Esses sete centros de força interior dão nascimento a um novo organismo, e as luzes de cores diferentes que circundam os órgãos sutis nos dão a conhecer os estágios de desenvolvimento. O verde é a cor do sétimo órgão.
Esse simbolismo sugere que Chidr, o Verde, está associado ao crescimento do novo corpo alma.
E é somente em um corpo-alma suficientemente sutil que o Espírito pode manifestar- se e unir-se à alma.
Todos esses exemplos mostram que o caminho que conduz ao reino de Chidr começa na escuridão do mundo da matéria, na fonte de Vida onde a natureza e o Espírito se encontram.
A água da Vida confere compreensão e conhecimento divinos.
O homem se eleva nesse conhecimento e com a nova consciência ele se “torna semelhante a Chidr”.
A partir desse momento, ele permanece no mundo da Luz, embora ainda viva na escuridão, a fim de indicar o caminho a todos os que buscam Chidr, até que também eles o encontrem interiormente.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Sufis



Assim como a supressão de um livre desenvolvimento interior, suscitada pela ignorância, faz parte do ser humano, assim também faz parte de sua natureza a propensão à busca por uma via de acesso ao divino, e isso jamais pode ser suprimido por muito tempo.

Uma compreensão interiorizada do Corão e de outras escrituras sagradas fez surgir uma nova prática de vida, libertando seus adeptos dos entraves sociais, do dogma imposto e dos valores da época.

Aqueles que seguiram esse caminho foram chamados "sufis", devido ao nome que se dava à veste de lã que usavam.

As descrições relativas às experiências que demarcam a aprendizagem,bem como as numerosas parábolas, testemunham da profundidade alcançada pelo homem que, tendo se tornado uno com a Gnosis, renasce para uma nova aurora.

Felizmente, foram conservados numerosos vestígios dos trabalhos sufis que tratam da vitória sobre o "eu" graças a uma orientação que encontra o seu ponto central em Deus.

Essas obras descrevem aquilo que os cátaros chamavam endura, a via na qual o eu capitula diante da alma divina interior que desabrocha.
Considerações detalhadas alternam com uma abundância de sentenças curtas que levam à reflexão. Elas mostram que os esquemas de pensamentos convencionais, que servem de guia aos desgarrados, são totalmente impróprios para o caminho de libertação da Alma.

Esses escritos revelam que vive-se o caminho "no presente", em nossa vida cotidiana, e que cada passo é dado na Luz disponível a cada instante.
Atravessar o deserto é um empreendimento suicida para aquele que previamente não avaliou as distâncias entre as etapas, não localizou os oásis, as zonas de sombra, os poços, e não administrou previdentemente os recursos alimentares e a manutenção da montaria.

Por analogia, os sufis distinguem diferentes "estados" (hal) e diversas "etapas" (magam) pelos quais o peregrino deve necessariamente passar.

Daí a comparação entre a viagem através do deserto e a caminhada do buscador da verdade.
Cada passo implica num esforço conscientemente orientado.

Para um, trata-se de encontrar sombra, um poço, um oásis; para o outro, uma faceta do ensinamento, uma fonte de aprofundamento para a consciência.

Ambos buscam um meio de avançar e não sucumbir. O oásis é o símbolo do templo iniciático, a aquisição interior, o tecer do novo manto da alma.

A viagem segue o seu curso. As etapas se sucedem, mas as aquisições permanecem.

É dito: Cada mudança de estado de consciência é um dom.

A viagem, o percurso mesmo, é uma graça. Essa progressão ao longo dos sucessivos estados de consciência é o fruto de pura magnanimidade, embora um esforço extremo, da parte do candidato, seja necessário.

Mas a cada etapa sua aquisição é uma posse firmemente estabelecida que lhe permite passar à etapa seguinte.

Al-Ghazzali, um teólogo árabe, ligou-se ao sufismo após anos de pesquisa e tentou conciliar a ortodoxia islâmica e o sufismo; mas semelhante tentativa era, por definição, fadada ao fracasso.

Espírito sistemático, esse autor distingue três aspectos para cada estágio: o ensinamento, o estado de consciência e o comportamento.

Ele diz:
"A compreensão é o cepo da árvore. Ela gera os estados de consciência que correspondem aos ramos, que por sua vez geram um comportamento que corresponde ao fruto. Isso se aplica a todos os estágios do caminho que conduz a Deus."

Na prática, as experiências da vida não se desenvolvem de modo tão regrado assim, a não ser na literatura.

Na realidade, as diferentes fases e estados de consciência se interpenetram e se influenciam mutuamente.
Nisso não há nada de surpreendente, pois podemos constatar numerosas variantes sobre esse tema.

Arrependimento (TAUBA) A primeira etapa a vencer no caminho, segundo o sufismo, é o arrependimento ou conversão (tauba).

Quão justo e irrefutável é isso! Especialmente se considerarmos a noção tauba como sendo a consciência torturante de se estar separado da vida original.

Essa é a primeira força requerida para nos desviarmos do caminho largo da religiosidade inconsciente, a da massa, sharia. Isso só é possível graças a uma consciente inversão no caminho de vida (freqüentemente devida a fatores exteriores) e encetar um novo comportamento, tariqa.

Uma lenda conta que uma noite o sufi Ibrahim Ibn Adham ouviu um ruído no telhado de seu palácio em Balkh. Os servidores encontraram lá
um homem que, levado diante de Ibrahim, fingia procurar no telhado o camelo que tinha perdido. O príncipe, em vista do absurdo da empresa,
repreendeu-o acerbamente. O homem disse a Ibrahim que suas tentativas de encontrar a paz celeste e uma autêntica vida espiritual em meio a todo aquele luxo era igualmente tão absurda quanto procurar um camelo no telhado. A essas palavras, Ibrahim experimentou um profundo arrependimento e se afastou de suas riquezas. Uma mudança, uma reviravolta repentina pode acontecer por ocasião de circunstâncias fortuitas, dando início a uma nova fase de desenvolvimento da consciência.
Segundo os textos, trata-se de um momento decisivo em que, pela primeira vez, a pessoa se volta conscientemente para o campo de vida original, para Deus. Um golpe de sorte, uma decepção ou um encontro particular podem servir como desencadeadores desse processo.

Elevado por um instante acima de sua consciência comum, o buscador "contempla" o ideal a ser alcançado.

O importante é que, quando o coração desperte de seu sono indolente, o homem veja sua condição lastimável,pelo menos em relação a esse ideal.

Tudo isso ele recebe porque a graça lhe é concedida e a divina admoestação se faz ouvir no mais profundo do ser, com o ouvido do coração.

A prática de tauba, contudo, levou um grande número de sufis a uma tal aversão pelo mundo que eles caíram no outro extremo: ascese e pobreza tomaram a amplitude de um fenômeno cultural, em vez de permanecer apenas um contingente.

Desprendimento e pobreza (FAQR) O pobre é tão monopolizado por sua pobreza quanto o rico o é por sua riqueza.
Para os observadores, a rejeição do mundo é o aspecto mais surpreendente do sufismo.
Os tratados abundam em exemplos de vida de pobreza (faqr) e de afastamento do mundo.

Essas interpretações tipicamente exteriores de uma condição interior exercem uma influência daninha sobre os candidatos, especialmente os principiantes.

Por meio de uma redução de sua dieta alimentar e longos períodos de jejum, o candidato espera chegar ao desprendimento do mundo e desse
modo ser agradável a Deus.

Riqueza e preocupação com bens materiais, como em outras religiões, podem ser consideradas obstáculos ao caminho espiritual, o que resulta que a ascese e a total negação do mundo material tornam-se, não raro, o orgulho do sofrimento.

Um sábio instrutor observa que um excesso de ascese e de negação nada mais é que uma "expressão de ansiedade e medo". Essa manifestação de ansiedade diante da ordem de natureza na qual vivemos é tão perniciosa quanto um excesso de riqueza e de opulência.
Trata-se tão-somente de conhecer suas possibilidades e limites inerentes a cada circunstância.
A aversão pelo mundo consiste em considerar as coisas em seu aspecto efêmero, de modo que elas percam, aos nossos olhos, toda importância, facilitando-nos a tarefa de nos afastarmos delas.

Numerosos sufis consideram a pobreza e a ascese como a indicação de sua vitória sobre o mundo, seguros de que sua vida exterior reflete seu estado interior.
Mas, para aqueles que buscam uma vida interior, não é o mundo que constitui o principal obstáculo, e sim o eu.

Trata o teu eu como algo sem importância, embora inevitável.
Aquele que é mestre de seu eu é poderoso, aquele que se deixa governar por ele é fraco.
Os desejos e as tendências que levam o homem à ação são associados pelos sufis aos impulsos instintivos e à alma-sangue, nafs. O nafs é um sedutor, pelo qual não se pode deixar levar.

A alma (terrestre) é como um cavalo diabólico. Quando soltamos as rédeas,
podemos ter certeza de que seremos derrubados.

Algumas biografias mostram que uma mudança intervém na vida do sufi quando ele vê os verdadeiros obstáculos e seu caminho não é mais caracterizado pelos extremos, por privações,tanto no plano externo quanto
no interno.

O desprendimento interior é fruto da compreensão.

Enquanto a pobreza exterior está ligada à aparência, a pobreza interior está estreitamente relacionada com o "diminuir" (literalmente: desfazer-se), com a "rendição", um estado ulterior.
Não me devolvas aquilo que me retirastes e não me deixes ver o meu eu,após teres dele me protegido.

Confiança em Deus e auto-rendição (TAWAKKUL). A confiança em Deus é um estado de despreocupação interna e externa, resguardado pela solicitude plena do amor de Deus.

Ela representa o próximo estágio importante no caminho do sufi. É um estado de consciência extremamente rico e inspirador, como testemunham estas duas citações:

Encontra o repouso aquele que impele o amor aos confins do seu coração.

Quando o coração está vazio, a renúncia ao mundo aí penetra, prodigalizando a confiança em Deus.

Mas o contrário também é correto:
Quando a confiança em Deus floresce de maneira sadia, a renúncia também vigora, pois a justa confiança em Deus possibilita a renúncia correta.

Essa fase da renúncia e do desprendimento é de grande importância e também cheia de nuanças, pois se relaciona à libertação das forças do eu que dirigem a personalidade, e isso não pode ser feito às pressas.
Uma nova consciência nascente e responsável deve servir de fundamento ao processo.

Grande vigilância e compreensão são necessárias ao candidato que também tem de dispor de uma boa estabilidade interior, de um equilíbrio de alma.

Somente então ele pode confiar inteiramente seu destino ao próprio Deus interno.

Possuir total certeza, denomina-se fé, tawakkul.

Paciência (SABR) A paciência é para a fé o que a cabeça é para o corpo.

Ela consiste em permanecer em harmonia tanto na provação como no bem-estar.
A longanimidade perfeita (sabr) diante dos golpes do destino e do pesar representa, no Oriente Médio, um dos pilares da senda.

Distinguem-se três níveis de realização:
1. esforçar-se por ser paciente,
2. suportar pacientemente as tentações,
3. mostrar-se paciente em todas as circunstâncias.
Essa sutil distinção é um exemplo da extrema precisão com que os sufis
definem as fases e os estados internos do caminho. Inúmeros relatos atestam
da necessidade da perseverança e da paciência.

Aqui, a figura clássica que descreve a vitória sobre o eu, a travessia do deserto, é bastante utilizada. É uma força especial que faculta o exercício da paciência, uma força graças à qual, no final de um longo treinamento, o candidato chega à impassibilidade interior.

De um lado há a orientação indefectível para Deus, a perseverança com Deus, e de outro lado, a abertura constante para a força divina na hora da tentação, a perseverança sem Deus. São tantas as pedras que se acumulam no caminho! Para alcançar o objetivo é preciso superar inúmeros obstáculos, o que é ilustrado pela curta história que segue:

Um dia, um homem chegou à casa de Ash-Shibli e perguntou-lhe:
Qual é a prova mais difícil de suportar para aquele que se exercita na paciência?

Ash-Shibli respondeu: A paciência em Deus.
Não, disse o homem. Ash-Shibli: A paciência para Deus. Não, disse o homem. Ash-Shibli: A paciência com Deus. Não, disse o homem.
Ash-Shibli: Então, o que é? E o homem respondeu: A paciência (de tudo suportar) sem Deus.
A essas palavras, Ash-Shibli gritou tão forte que quase rendeu a alma.

Amor (MAHABBA) e diminuição (FANA). O amor é o fruto da compreensão.

Se por um lado o amor terrestre nos liga a uma outra pessoa, a um objeto ou a um interesse qualquer, por outro lado o amor divino possui uma totalmente outra definição: é a força que conduz de etapa em etapa, ao longo de um caminho de evolução, até se tornar um estado de consciência.

Assim, o conceito Arif, aquele que possui o entendimento, aplica-se freqüentemente aos sufis avançados.

Al-Ghazzali escreveu:

"O amor sem a compreensão é impossível, pois não se pode amar o que não se conhece."

Na literatura sufi, a noção "bem amado" representa um papel importante, pois a pessoa amada é o símbolo da ligação com o divino.

"O amor, é dito, é um fogo no coração, que queima tudo o que o amado não deseja."

O amor, nascido do conhecimento interior, representa o último estágio do caminho.
No início, é a obediência absoluta a um mestre (shaikh) que é exigida do candidato. O estágio final é marifa, o conhecimento interior divino.

Somente o candidato avançado conhece a força e o potencial do verdadeiro amor servidor, que é a única via de reintegração com Deus.

Para um simples fiel da religião muçulmana (islã significa submissão à vontade de Deus), é quase impossível ultrapassar o estágio de obediência a um mestre.

Por isso, coloca-se o amor no mesmo nível que a diminuição do eu.

O amor devotado a Deus, que não exclui nenhuma parte da criação, alimenta-se da aspiração à revelação divina e se consolida pelo rasgar dos véus que impedem a contemplação da transcendência interior.

Após o esquecimento temporário, há a asnai, o conhecimento reencontrado da origem.
O estágio de diminuição do eu é indispensável para encontrar o conhecimento do início absoluto e do esplendor da eternidade.

Este último degrau no caminho da iniciação sufi não é, em realidade, um fim.
Poder-se-ia dizer que aqui se perde o rastro daquilo que nossa consciência natural pode conceber.
A partir daí, o sufi caminha para o verdadeiro objetivo da existência humana,o advento do homem-espírito, a realização final do plano divino.
Embora seja impossível comunicar algo sobre esse nível de elevação do processo, pode-se, contudo, decodificar os escritos redigidos pelos mestres a seus alunos.

terça-feira, 20 de março de 2012

GNOSIS


As Escolas de Mistérios existiram até na época de Jesus. Algumas se encontravam em Eleusis e em Delfos, na Grécia, onde Orfeu e Apolo eram venerados como guardiães dos Mistérios.

Na Pérsia, elas ensinavam a sabedoria de Zoroastro; no Egito e na Ásia Menor, elas se baseavam no ensinamento de Atis ou Osíris.

O Antigo Testamento refere-sea elas em textos que falam dos Nazarenos, homens consagrados a Deus, como Sansão e Gedeão.

As pesquisas atuais provam que os profetas conheceram estas Escolas dos Mistérios, pois eles sempre estavam ensinando que os rituais exteriores representavam processos internos que conduzem à ligação entre o homem e Deus.

Nesta época, sabia-se que, se o homem quisesse unir-se a Deus, deveria ultrapassar o ponto mais baixo da materialidade.

Os que já eram iniciados recebiam o conhecimento encerrado nos Mistérios.

Neste processo, os mediadores estavam em ligação consciente com as forças divinas e suas leis e viviam através delas. Portanto, é de interesse secundário saber quais eram os símbolos
utilizados para transmitir este conhecimento.

Até a vinda do Mestre Jesus, o Cristo, estes Mistérios foram mantidos em segredo.

Mestre Jesus mostra claramente, àqueles que o ouvem, que a natureza terrestre pode ser anulada por um processo consciente, no decorrer do qual acontece o despertar e o crescimento do “Deus em mim”.

“Quem quiser perder sua vida por mim” (por amor ao Espírito divino) “a ganhará”.

A vida do Mestre Jesus dá testemunho do processo que, até esta época, só poderia ser cumprido entre as paredes de uma Escola de Mistérios.

Em seus pensamentos, seus sentimentos e sua vontade, ele renunciou a seu egocentrismo para que o filho de Deus florescesse dentro dele.

A humanidade havia chegado ao ponto em que os Mistérios deviam ser revelados para garantir seu progresso espiritual.

Tornou-se possível vivenciar o processo da morte e da ressurreição interiores de modo autônomo e responsável.

Isto significa que, há cerca de 2.000 anos, o despertar do verdadeiro ser podia tornar-se um processo consciente.

Portanto, os Mistérios estavam abertos a todos e já não eram reservados exclusivamente a um pequeno grupo de eleitos, iniciados, por assim dizer, exteriormente.

A iniciação tornava-se um processo interior que era preciso ser vivido com plena consciência.

Mestre Jesus revelava o conhecimento oculto; e este conhecimento, a Gnosis, surgiu como uma corrente historicamente visível nas regiões à volta do Mediterrâneo.

Sempre nos perguntamos como a Gnosis surgiu tão de repente, pois parece que ela veio ao mundo como que saída do nada, sem preparação, e já completamente adulta.

Ela carregava em si traços de todas as culturas e tradições do tempo. Mas qual era sua origem? A Pérsia, Israel, a Grécia, o Egito?

Daí para a frente, as Escolas de Mistérios, que jamais deixaram de seguir o mesmo objetivo, podiam revelar abertamente sua doutrina, e a sabedoria gnóstica foi transmitida quase simultaneamente, sob formas bem diversas, entre os judeus, os gregos e os persas.

Qual forma prevaleceu? Isto não tem a menor importância, pois destes locais sagrados irradiou-se uma poderosa corrente universal de força gnóstica que veio sustentar a sabedoria que já havia
sido divulgada.

Muitos se indagaram por que tantos grupos gnósticos falavam de salvadores do mundo diferentes de Jesus, agora que Jesus era considerado “o Salvador”, a força salvadora.

Em alguns manuscritos de Nag Hammadi, os salvadores têm nomes egípcios e persas, enquanto outros mencionam Mestre Jesus.

Os Hierofantes dos Mistérios que abriram suas portas na época de Jesus
sabiam que a sabedoria estava manifestada nele e que começava uma nova fase do caminho que conduz à meta final, mas alguns ainda utilizavam nomes dos salvadores originais de períodos anteriores.

Por exemplo, alguns escritos de Nag Hammadi falam de Set, filho de Adão.

Outros adaptaram seus ensinamentos ao novo período e introduziram o nome do Mestre Jesus, o Cristo.

Mas será que é tão importante saber o nome dado à força libertadora,
para quem quer percorrer o caminho e tornar-se o verdadeiro Homem?

Não é verdade que é ao Homem original que estes escritos estão-se referindo?

Também fica claro porque os escritos gnósticos sempre mostram a libertação como parte de um grande processo cósmico.

Quando se trata da salvação no Novo Testamento, pouco se menciona a criação do mundo e o papel da humanidade neste processo, e não há alusão a respeito da humanidade anterior à
queda, nem sobre a possibilidade de uma volta a esta humanidade.

O Novo Testamento se limita em falar sobre a libertação em si enquanto a sabedoria tradicional judaica, grega e egípcia demonstra claramente as relações cósmicas deste processo.

É por isso que todos os sistemas gnósticos propõem mitos que explicam o nascimento do mundo espiritual, a criação do mundo terrestre, as hierarquias espirituais dos anjos e arcontes que
governavam o mundo.

Diz-se que o conceito “Gnosis” procedia de características psíquicas e espirituais do tipo humano mediterrâneo de cerca de 2.000 anos atrás.

Este homem vivenciava, então, uma espécie de vazio, pois todos os valores espirituais e tradicionais estavam virando ruínas.

Todas as certezas estavam-se desfazendo.

As estruturas sociais, as normas e os valores gerais já não ofereciam nenhum apoio.
A humanidade estava enfrentando um caos indescritível.

Neste sentido, é evidente o paralelo com nossa época.


Pensou-se que, para preencher este vazio, alguns imaginaram uma série de certezas e de processos sobrenaturais no interior dos quais seria possível alguém se retirar a fim de poder, ao menos, continuar a existir.

Segundo esta teoria, os sistemas gnósticos não passam de reações ao ambiente e à natureza, e não possuem nenhum valor objetivo.

Mas, de acordo com escritos gnósticos autênticos, mostra-se, entretanto, que as experiências de seus autores não dependem de modo algum das circunstâncias sociais ou outras.

São experiências interiores que somente podem ser vivenciadas quando o princípio espiritual latente no ser humano está despertado e lhe mostra a instabilidade e a impiedade do mundo.

Assim, não é importante se o mundo está bonito ou caótico.

Pode acontecer, porém, que estas experiências somente possam realizar-se quando todos os sistemas antigos se desfazem e quando o ser humano se encontra em total confusão.

Não podemos marcar as experiências gnósticas com uma etiqueta histórica, psicológica ou cultural.

Também não se trata de colocar a Gnosis na lista dos produtos da sabedoria tradicional.

A Gnosis sempre será uma experiência direta da Luz divina.

Se quisermos ligar novamente a Sabedoria dos Mistérios ao desenvolvimento da História, podemos somente dizer que os antigos símbolos servem para representar processos que se manifestam.

Os locais sagrados servem, por assim dizer, de vestes para a sabedoria.

Esta sabedoria carregada de força libertadora impulsiona o gnóstico a seguir o caminho indicado dentro de seu próprio ser interior, para aí buscar a libertação de sua alma.

Se quisermos estudar a origem e o significado do conceito “Gnosis”, será preciso perguntar de onde provém a Sabedoria original das Escolas dos Mistérios de todos os tempos.

Os biólogos sempre gostam de explicar que a origem da vida vem de outro planeta. Mas isto somente desloca esta origem, sem explicá-la.

O mesmo acontece com a origem da Gnosis. As experiências gnósticas dizem respeito à vivência individual de uma ligação direta com Deus. Estas experiências estão fora do tempo, fora da
História, fora dos modelos culturais. Não são nem especulações, nem invenções arbitrárias.

Elas tratam do ser verdadeiro dentro do homem, da realidade do mundo de onde provém o homem interior e do que é característico da Gnosis, do caminho que é preciso ser vivenciado para voltar ao mundo original.

Trata-se de uma verdade universal.

Esta se manifestou aos mestres e a seus alunos.

Ela se manifestou a Jesus, o Cristo, que a ensinou publicamente.

Suas experiências são confirmações das experiências dos gnósticos.


Muitos deles foram seus discípulos, e outros, os discípulos de períodos mais recentes.

Todos deram testemunho da mesma coisa porque vivenciaram o mesmo processo dentro de suas almas.

Assim, pode-se dizer que a Gnosis se manifesta com toda a certeza em momentos precisos da História da humanidade; e que, no momento em que os homens estiverem maduros o bastante para
receber este conhecimento direto, os instrutores da Gnosis aparecerão.

É o que acontece em nossos dias, quando inúmeros buscadores podem encontrar dentro de si mesmos a senda que conduz à Gnosis.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Galileu Galilei



Em 22 de junho de 1633, numa sala do convento dominicano de Santa Maria Sopra Minerva, em Roma, encerrou-se um dos episódios mais nefastos da história: o julgamento de Galileu Galilei pela santa inquisição, sua condenação e subseqüente renúncia à crença de que a Terra gira em torno do Sol.
Ao sair do tribunal, Galileu disse uma frase célebre: "Epur si Muove!", que traduzida diz, "E, no entanto, ela move-se". Murmurou esta frase depois de ter sido obrigado a retratar-se, diante da inquisição, sua crença de que a Terra se move em torno do Sol.
" Eu, Galileu Galilei, filho do falecido Vincenzio Galilei de Florença, com a idade de setenta anos, sendo trazido pessoalmente a julgamento, e ajoelhado diante de vós, Eminentíssimos a Reverendíssimos Lordes Cardeais, Inquisidores Gerais da Comunidade Cristã Universal contra a depravação herética, tendo diante de meus olhos o Sagrado Evangelho que toco com as minhas próprias mãos, juro que sempre acreditei, e, com a ajuda de Deus, acreditarei no futuro, em todo artigo que a Santa Igreja Católica Apostólica Romana mantém, ensina e prega. Mas por ter sido ordenado, por este Conselho, a, abandonar completamente a falsa opinião que mantém que o Sol é o centro e imóvel, e proibido de manter, defender ou ensinar a referida falsa doutrina de qualquer maneira (...) Estou desejoso de remover das mentes do nossas Eminências, e de todo Cristão Católico, essa veemente suspeita acertadamente mantida a meu respeito, portanto, com sinceridade de coração e fé genuína, eu abjuro, maldigo e detesto os Referidos erros e heresias, e, de modo geral, todos os outros erros e seitas contrários à referida Santa Igreja; e juro que jamais no futuro direi ou asseverarei seja o que for, verbalmente ou por escrito, que possa motivar uma. Suspeita similar de mim; mas que se eu souber de algum herético, ou de alguém suspeito de heresia, denunciá-lo-ei a este Santo Conselho, ou no Inquisidor ou Ordinário do lugar em que eu esteja. Juro, mais ainda, e prometo que cumprirei observarei plenamente todas as penitências que a mim tenham sido ou venham, a ser impostas por este Santo Conselho. Mas, caso aconteça que eu viole qualquer de minhas promessas, juramentos e protestos citados, eu me sujeito a todas as dores e punições decretadas a promulgadas pelos sagrados cânones e outras constituições gerais e particulares contra delinquentes dessa descrição. Assim, que Deus me ajude, a Seu Sagrado Evangelho, que eu toco com as minhas próprias mãos; eu, o acima citado Galileu Galilei, abjurei, jurei, prometi e me comprometo como acima; e, em testemunho do que, com a minha própria mão subscrevi o presente escrito de minha abjuração, que eu recitei palavra per palavra."

Jacob Boehme - 2

"Deus está na sublime semelhança e não no espírito das estrelas e dos elementos; ele nada possui além de si mesmo em sua própria semelhança. E mesmo que ele possua algo, somente compreende aquilo que nasceu e emanou dele: a alma à semelhança de Deus. É por isto que tudo o que escrevo é parecido com o que escreve um aluno que vai à escola. Deus conduziu minha alma a uma escola maravilhosa, e eu realmente não posso admitir que meu ego possa ser ou compreender alguma coisa."

Neste mundo de informação ilimitada, será que Jacob Boehme (1575-1624) ainda tem algo a dizer aos homens modernos, que já sabem de tudo?

Qualquer pessoa que parta deste ponto de vista terá pelo menos um sorriso de complacência lendo os textos e pensamentos deste simples sapateiro de Görlitz na antologia de suas obras intitulada Viver na simplicidade de Cristo.

Mas quem, hoje, ainda fala tão convincente e profundamente de Cristo, de Deus e do Espírito Santo?

A teologia, o materialismo e as ciências, conduziram a humanidade ao mais baixo ponto de seu desenvolvimento.

Ódio, violência, guerra, genocídio fazem parte integrante da vida cotidiana.

"Viver na simplicidade", conforme escreve Jacob Boehme, é um conceito que se apresenta completamente diferente em 2012.

A prosperidade aproxima os modos de vida de inúmeras culturas diferentes e há tal excesso de coisas materiais que a simplicidade é novamente percebida como "a característica do que é verdadeiro".

Mas será que uma decoração interior sóbria, quase vazia, com uma única e bela obra de arte... e todo o conforto, testemunham esta simplicidade descoberta por Jacob Boehme?

"Não escrevo para aqueles que estão imbuídos de preconceitos, que compreendem e sabem tudo mas que no entanto não sabem nada, pois eles já estão satisfeitos e ricos, mas sim para os simples como eu, e assim me alegro com meus semelhantes."

Qualquer pessoa que tente captar algo da sublime verdade que Boehme quer transmitir a seus semelhantes deverá, portanto, se alistar entre os simples; somente assim ficará, talvez, esclarecido o que ele quer dizer por palavras e conceitos como Deus, Espírito e Cristo.

"Ninguém deve pensar mais a meu respeito além do que está vendo aqui, pois a obra de meu trabalho não é minha, ela não me pertence a não ser na medida em que o Senhor concedeu. Sou apenas seu instrumento, com o qual Ele faz o que quer. Digo-te isto como uma advertência, a fim de que ninguém tente encontrar em mim um homem que não sou, como se eu fosse um artista e fosse dotado de grande inteligência."

Portanto, não se trata de um estilo de vida sóbrio e moderno, de nenhuma obra artística ou científica.

Jacob Boehme deseja que seu leitor seja um buscador, alguém que aprenda todos os dias e cada vez mais a renunciar a seus próprios desejos.

Alguém que, aberta e honestamente, a partir da infinita variedade da vida cotidiana, queira penetrar até a "Vida na simplicidade de Cristo".

Quem era Jacob Boehme, na realidade?
O que este homem tinha a dizer a sua época?
E o que podemos aprender com ele?

Jacob Boehme nasceu em 1575, em Alteseidenberg, uma cidadezinha situada ao sul da cidade alemã de Görlitz, na fronteira polonesa. Sua data de nascimento fica no meio de um período muito movimentado, compreendido entre o início da Reforma (1517) e a atrocidade da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648).

As pessoas que tinham espírito conservador estavam preocupadas com a derrocada do mundo, com a vinda do Anticristo e com o anti-papismo, enquanto que os livres-pensadores se interessavam por um novo mundo que pudesse oferecer novas possibilidades à humanidade.

Jacob Boheme, piedoso e sério, nasce em um mundo em que as comunicações ainda estavam submetidas às limitações da distância. Ele se tornou aprendiz de sapateiro, formou família e
exerceu sua profissão. Nisto, ele não era nem um pouco diferente de seus semelhantes.

Em seu livro Aurora, a aurora nascente (A raíz da filosofia, da astrologia e da teologia, escrito em Görlitz, na terça-feira após Pentecostes, no ano de1612), ele descreve como, por quatro vezes, ele foi tocado pela luz.

Na segunda vez, ele pode "lançar um olhar até o fundo mais íntimo ou centro da natureza oculta". As idéias que ele tirou daí não cessaram de se confirmar, pois a cada dia ele encontrava no coração as maravilhas de Deus.

Sua alegria por estes toques era grande, mas ele mal falava dela, se bem que tentasse descrevê-la por si mesmo ou com a ajuda de alguns amigos.

Segundo ele, isto não era fácil. Tratava-se de verdades universais que sempre foram válidas, mas que são difíceis de serem expressas por palavras.

É que elas têm de ser experimentadas.

Jacob Boehme estava perfeitamente consciente disto. "As palavras matam a viva corrente divina." E ele lutou para traduzir esta força viva, pois ele queria servir-se da linguagem tão somente para descrever suas experiências, mas principalmente para transmitir a Verdade viva e fazer com que seus semelhantes pudessem senti-la.

Em 1613, um manuscrito caiu entre as mãos do pregador de Görlitz, Gregoire de Richter. Depois do ofício religioso, em que Boehme foi atacado do alto do púlpito, ele esperou o pregador para perguntar-lhe quais eram os pecados que ele havia cometido e como ele poderia remediar isto.

A resposta foi somente uma reação furiosa, e assim começou uma campanha de ódio contra o "filósofo teutônico".

As idéias de Boehme eram diametralmente opostas às convicções religiosas da época.
O que despertou mais a oposição e o ódio foram principalmente seus escritos sobre a vontade oculta de Deus e a vontade do homem.

Boehme considerava a força crística como mediadora na relação entre Deus e o homem. Cristo era o poder que permitia a reconciliação do homem, que se tornara novamente humilde com seu Deus.

Neste processo, Boehme não coloca o mediador em uma região celeste indefinida,mas dentro do próprio homem.

Ele fala de experiência própria, pois ele havia encontrado este poder dentro de si mesmo, sem ajuda de nenhuma instituição, pessoa ou texto.

Estes assuntos o aproximavam da tradição mística de Mestre Eckhart (1260-1327/29) e Thomas A’Kempis (1379-1471).

Suas experiências não-dogmáticas suscitaram reações, como acontece com todos os que buscam a verdade: processos, perseguições, campanha de calúnias, banimentos,prisão.

Nada lhe foi poupado. Além disto, proibiram a publicação de seus escritos.

Jacob submeteu-se durante seteanos a este veredicto, e depois reuniu em torno de si um círculo de simpatizantes para esclarecer certas passagens da "Aurora nascente", a pedido de alguns amigos.

Ele chamou este grupo de "Escola doPentecostes teosófico".

Com auxílio de imagens e de conceitos tirados da Bíblia, da astrologia e da alquimia, Boehme tentou fazer com que eles partilhassem com ele a compreensão da relação eterna entre Deus, o homem e o mundo. Seus escritos circularam exclusivamente em pequenos cenáculos.

Em 1619, ele vivenciou um novo impulso de luz e nos cinco últimos anos de sua vida ele escreveu trinta livros e mais de cem cartas, cerca de quatro mil páginas, no total.

Nesses textos, ele fala do fogo oculto que brilha dentro dele e das dificuldades que encontra em traduzir suas experiências por meio de palavras.

Cada novo texto foi sendo seguido por interrogatórios, ameaças e afrontas.

Além disto, Jacob Boehme reagiu em conformidade com suas idéias sobre as razões pelas quais Deus permite o sofrimento neste mundo:

"Pergunta: a razão fala: Por que Deus criou a vida sofrida e dolorosa? As circunstâncias da vida não poderiam ser melhores, sem sofrimentos e tormentos, posto que ele é o começo e o fim de
todas as coisas? Por que ele tolera a oposição? Por que ele não faz com que o mal desapareça, posto que ele é o Único Bem em todas as coisas?

Resposta: Uma coisa não pode aprender a se conhecer sem oposição, pois, se ela não tivesse nada que lhe oferecesse resistência, continuaria indefinida e não se voltaria para si mesma.
E se ela não voltasse para dentro de si mesma, lá de onde ela provém em sua origem, ela nada saberia a respeito de seu estado.

Se a vida natural nãoconhecesse oposição e se ela não tivesse nenhuma finalidade, ela jamais se perguntaria a respeito das profundezas de onde ela saiu; assim, o Deus oculto continuaria desconhecido para a vida natural.

Por mais que tenha sofrido profundamente o "furor satânico" de seus perseguidores, que nada compreendiam de seus textos, Boehme continuou sendo clemente, pois sabia que a oposição é
inevitável e necessária.

Dizem que ele teria dito um dia que seu "inimigo" preferia um bom copo de vinho a uma discussão sobre o renascimento em Cristo.

Até sua morte, em 1624, este grande místico e filósofo foi ignorado pelo clero oficial. Recusaram-lhe um túmulo e uma homília.

Jamais foi publicado qualquer aviso de falecimento.

Ao lado de todos estes ultrajes, ele também teve reconhecimento e estima.

Na corte de Dresden, liam seus textos. Por mais que eles fossem oficialmente proibidos na Alemanha, eles seguiram seu destino até os buscadores, por intermédio de inúmeros simpatizantes de outros países.

O negociante holandês Abraham Willemszoon van Beyerland desempenhou um papel importante na impressão e na difusão de sua obra.

A influência de Boehme sobre o espírito dos europeus ocidentais é inegável.

 
Príncipes, sábios, filósofos, teólogos, esotéricos, todos se debruçaram sobre sua obra e aprenderam muito, sendo influenciados por elas.

Entre eles, nomes célebres: Leibnitz, Spinoza, Hegel, Schopenhauer e Isaac Newton.

As obras que escreveu são o maior monumento de conhecimentos teogônicos (concernentes ao surgimento dos primeiros princípios em Deus) e cosmogônicos (concernentes à criação do Universo e das criaturas) da história do cristianismo.
Boehme teria, sem dúvida, ficado bem espantado em saber que tantos grandes espíritos puderam dizer que eram seus discípulos, pois ele não se considerava nem um mestre nem um pastor, nem um ser excepcional!

Ele viveu muito lucidamente, em "divina oferenda", e transmitiu suas experiências e percepções àqueles que eram receptivos a elas.

É assim que tentou levar seus semelhantes ao renascimento pela força de Cristo, acontecimento interior não ligado ao tempo ou a dogmas.

No decorrer de quatro séculos, ele deu uma nova esperança a muitos. Assim, descobriram que o homem leva duas vidas: a do homem biológico que se constrói com ajuda de inúmeras forças naturais, e a vida cuja essência tem por origem Deus.

Somente poderemos atingir esta última graças ao renascimento pela força crística universal, processo que se desenvolve no homem interior.

O homem da natureza deve diminuir cotidianamente para finalmente se aniquilar a fim de que o ser de essência divina desperte.

Jacob Boehme não considerava Cristo como uma pessoa, mas como uma força recriadora.
Uma força una, "simples", que é preciso ser admitida no coração: a única força que sempre foi, é e será. É a partir desta força que se desenvolve a "verdadeira vida" que Jacob Boehme designa pelas seguintes palavras:

"Viver na simplicidade de Cristo".

 
*Obras em português, A aurora nascente, A sabedoria divina, A revelação do grande mistério, Os três princípios da essência divina, Quarenta questões sobre a alma.